domingo, 12 de agosto de 2007

Acórdão Desembargador(a) Federal Relator(a)



Recebimento Interno de Gabinete Desembargador Federal Francisco Cavalcanti [Guia: 2004.001429]
[Guia: 2004.001429] (M638)
Em 20/10/2004 16:27

Acórdão Desembargador(a) Federal Relator(a)
[Publicado em 26/10/2004 00:00] [Guia: 2004.001429] (M5373) EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ - UVA. COBRANÇA DE TAXAS AO CORPO DISCENTE. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. GRATUIDADE DO ENSINO PÚBLICO EM ESTABELECIMENTOS OFICIAIS. ART. 206, IV, DA CF/88. EXCEÇÃO. ART. 242, DA CF/88. ADMISSIBILIDADE DA EXIGÊNCIA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. RESPEITO. HIPOSSUFICIÊNCIA DE PARTE DO ALUNADO. DIREITO À PRESTAÇÃO GRATUITA. AFERIÇÃO POR CRITÉRIO OBJETIVO. FAIXA DE ISENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. COMPATIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS E INTERESSES CONSTITUCIONALMENTE GARANTIDOS.1.
A natureza das atribuições determinadas como de competência do Ministério Público, a dimensão de sua responsabilidade, a pluralidade de categorias e temáticas em relação às quais detém incumbências de particular seriedade, o poder investigativo, fiscalizador e determinante de que foi dotado esse agente - constitucionalmente qualificado pela sua essencialidade à função jurisdicional do Estado - impõem seja admitido, com largueza, o exercício de ações coletivas pelo Ministério Público, não sendo aceitáveis, em sentido oposto, interpretações restritivas ou inibidoras. Ao Ministério Público se confere o dever de salvaguarda, não apenas dos direitos ditos indisponíveis, mas também dos interesses socialmente relevantes, independentemente da indisponibilidade que os grave ou não, ou seja, das pretensões que se reconheçam com repercussão ou reflexão na coletividade considerada em conjunto. Assim, nesse contexto, não se pode permitir a atuação do Ministério Público na proteção de interesses marcados pela individualidade, com exercitação confinada no correspondente titular, sem reverberação no campo do social. Contudo, de outro lado, ao Ministério Público não se pode deixar de reconhecer a sua responsabilidade na promoção de direitos e reivindicações que, embora com titulares identificados ou identificáveis, têm acentuada conotação social, seja pela natureza do objeto pretendido, seja pela qualidade distintiva de certa categoria, cujas necessidades sejam discernidas pela própria sociedade como precisões de índole coletiva ou arrimadas em cuidado especial restaurador de equilíbrio indispensável diante das dificuldades vivenciadas em relação à própria inserção social. A norma legal que instituiu a ação civil pública - Lei nº 7.347/85 - nasceu como "lei dos interesses difusos". Posteriormente, em decorrência especialmente do alargamento providenciado pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11.09.90), a ação civil pública passou a ser admitida para fins de proteção de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, denominados, genericamente, de interesses transindividuais. A doutrina tem se referido ao fato de que promoção de direitos individuais homogêneos ("acidentalmente coletivos") teria cabimento apenas quando se tratasse de meio ambiente, consumidor e patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, não havendo, de outro lado, limitação material, quando secuidasse de direitos coletivos e difusos ("essencialmente coletivos"). É de se ressaltar, entretanto, que, a despeito dessa diferenciação, tem-se agasalhado, em outras oportunidades, uma compreensão mais ampliada dos direitos individuais homogêneos, reputados espécies do gênero coletivo, aptos a serem defendidos através da propositura da ação civil pública, especialmente quando ela é manuseada pelo Ministério Público. Passou-se a se conceber a promoção da ação coletiva em defesa de direitos individuais homogêneos quando configurado manifesto interesse social, compatível com a finalidade da instituição ministerial. Estão em litígio direitos que se pode qualificar de individuais homogêneos, aptos a serem defendidos pelo Ministério Público, diante de sua vigorosa conotação social, identificada pela temática-núcleo da lide (a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais, nos moldes definidos pelo art. 206, IV, da CF/88, como faceta do direito à educação). Inteligência do art. 5o, II, d, da LC nº 75/93. Por conseguinte, é de se afastar a preliminar de ilegitimidade ativa.2. A competência da Justiça Federal se assenta em vista da matéria em discussão (ensino superior, ministrado por instituição estadual em decorrência de delegação federal), bem como diante da participação do Parquet Federal em um dos pólos da demanda.3. Tratando-se de a) instituição educacional oficial criada por lei estadual, b) preexistente à promulgação da CF/88, c) mantida total ou preponderantemente com recursos de natureza privada, há explícita previsão de não submissão à regra da gratuidade, nos moldes do art. 242, da CF/88, que excepcionou o disposto no art. 206, V, do Texto Constitucional. Esse é o caso da instituição de ensino ré. A UVA foi criada pela Lei Estadual nº 10.033, de 10.10.1984 - antes, portanto, da promulgação da CF vigente -, sendo sustentada substancialmente com recursos obtidos junto à comunidade discente. Segundo documento colacionado nos autos, não contraditado especificamente pelo autor, apenas em 2002, enquanto são referidos R$123.522,37 correspondentes a recursos ordinários do Governo do Estado, registrou-se R$940.347,83 havidos mediante arrecadação direta via taxas. O peso, portanto, é expressivo e, em sendo inviabilizada a cobrança de tais parcelas, ter-se-ia uma redução significativa da receita destinada à manutenção da entidade.4. A previsão de taxas de inscrição e anuidades está contida na Lei Estadual nº 10.033/84. Quanto aos demais serviços (declaração de matrícula, histórico escolar, programa de disciplinas, grade curricular, entre outros) não estão abrangidos pela regra do art. 206, IV, da CF/88, correspondendo apenas a uma contribuição dos beneficiários dos serviços operacionais (secundários) prestados pela universidade, sendo fonte de receita destinada à mantença desses.5. O problema em questão é extremamente sério e delicado, à medida que traz à tona, necessariamente, por público e notório, o encolhimento do financiamento das instituições de ensino pelo Estado, fato gerador de depauperamento, de sucateamento e de ruína das entidades dedicadas à prestação desse serviço público por essência, que não pode prescindir, contudo, em razão de sua natureza, da cooperação da sociedade. Inteligência do art. 205, da CF/88.6. Se, de um lado, o Estado vai retirando, paulatinamente, as receitas que se destinavam ao custeio das instituições de ensino, fazendo com que essas entidades tenham que buscar o custeamento em outras fontes, inclusive junto aos próprios estudantes, sob pena de paralisação de suas atividades ou perda de qualidade daeducação oferecida, de outro lado, não se pode desconsiderar a penúria em que vive grande parte da sociedade brasileira, impossibilitada de contribuir financeiramente para o mantimento das universidades, mas necessitada de inclusão educacional, pressuposto esse da integração social e do afastamento da marginalização.7. A despeito de se reconhecer plenamente constitucional a cobrança das taxas pela UVA, não se pode deixar de garantir o acesso à educação àqueles que se encontrem em situação de hipossuficiência, pois também é exigência constitucional seja assegurado o ingresso do estudante necessitado nas instituições de ensino superior. Resta, contudo, definir o que se considera como carência para efeito de deferimento da gratuidade. Nesse sentido, é preciso fixar um critério objetivo, de sorte que a outorga não fique na dependência do entendimento subjetivo da entidade, bem como de modo que não dê ensanchas a abusos. Assim, é de se reconhecer o direito à gratuidade, inclusive de taxas, aos discentes que se encontrem integrados em grupo familiar isento de imposto de renda. Objetivada a hipótese, harmonizam-se os direitos e interesses constitucionalmente garantidos.8. Pelo parcial provimento da remessa necessária e da apelação, para manter a gratuidade apenas para os alunos, cujos correspondentes grupos familiares sejam isentos de imposto de renda.ACÓRDÃOVistos e relatados os presentes autos, DECIDE a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares e, no mérito, pelo voto médio, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, para manter a gratuidade apenas para os alunos, cujos correspondentes grupos familiares sejam isentos de imposto de renda, nos termos do relatório e voto condutor anexos, que passam a integrar o presente julgamento. Vencidos em parte o Desembargador Federal Relator e o Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima.Recife, 06 de abril de 2004. (Data do julgamento)
Em 05/05/2004 16:37

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